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Por uma história visual de passados possíveis na prática artística de Rosângela Rennó*

Hacia una historia visual de pasados posibles en la práctica artística de Rosângela Rennó**

Toward a Visual History of Possible Pasts in Rosângela Rennó’s Artistic Practice***




10.5294/pacla.2023.26.1.4


Ana Maria Mauad1

1 0000-0001-8973-5238. Universidade Federal Fluminense, Brasil. [email protected]

* Pesquisa financiada pelas agências de fomento brasileiras: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (projeto 303292/2018-0) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (projeto SEI-260003/001196/2020).

** Investigación auspiciada por las agencias de fomento brasileñas: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (proyecto 303292/2018-0) y Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (proyec- to SEI-260003/001196/2020).

*** This research was financed by the Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Pro- ject 303292/2018-0) and the Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Project SEI- 260003/001196/2020).


Recebido: 20/08/2022
Submetido a pares: 18/09/2022
Aprovado por pares: 04/10/2022
Aceito: 13/12/2022


Para citar este artículo / to reference this article / para citar este artigo: Mauad, A. M. (2023). Por uma história visual de passados possíveis na prática artística de Rosângela Rennó. Palabra Clave, 26(1), e2614. https://doi.org/10.5294/pacla.2023.26.1.4



Resumo

Este artigo aborda a prática artística de Rosângela Rennó relacionando-a aos princípios da prática historiadora contemporânea. Com base em uma trajetória sobre as diferentes obras em que a artista convoca o passado como matéria de imaginação, destacam-se, sobretudo, estratégias utilizadas para trazer à tona passados possíveis que confrontassem narrativas celebrativas de passados cristalizados. Propõe-se, assim, uma reflexão sobre a relação entre prática artística e historiadora enquanto meios para histórias públicas, seguindo um percurso metodológico que se inicia com alguns paralelos e aproximações entre artes visuais e história para compreender possíveis usos de materiais históricos nos projetos da artista. Em seguida, correlacionam-se os debates sobre as experiências da “morte da fotografia” e do “fim da história”, no bojo das viradas pictóricas ou visuais como fenômeno de geração, e conclui-se com um exercício de interpretação histórica dos trabalhos de Rosângela Rennó.

Palavras-chave (Fonte tesauro da Unesco): Artes visuais; fotografia; história pública; documento.



Resumen

El artículo aborda la práctica artística de Rosângela Rennó y la relaciona con los principios de la práctica historiadora contemporánea. Desde un recorrido por las diferentes obras en las que Rennó convoca el pasado como materia de imaginación, se destacan, sobre todo, las estrategias utilizadas para sacar a la luz pasados ​​posibles que confrontan las narrativas celebrativas de pasados ​​cristalizados. Por lo anterior, se plantea una reflexión sobre la relación entre la práctica artística y la práctica historiadora como puente para las historias públicas, siguiendo un camino metodológico que parte de algunos paralelismos y aproximaciones entre las artes visuales y la historia, para comprender los posibles usos del material histórico en los proyectos de la artista; contempla los debates sobre las experiencias de la “muerte de la fotografía” y el “fin de la historia”, en el marco de los giros pictóricos o visuales como fenómeno de generación, y se concluye con un ejercicio de interpretación histórica de la obra de Rosângela Rennó.

Palabras clave (Fuente tesauro de la Unesco): Artes visuales; fotografía; historia pública; documento.



Abstract

The article addresses Rosângela Rennó’s artistic practice, relating it to the principles of contemporary historian practice. An overview of the different works in which the artist summons the past as a matter of imagination highlights strategies to bring up possible pasts that confront celebratory narratives of crystallized pasts. Therefore, we reflect on the relationship between artistic and historical practices as means for public histories. We follow a methodological path that begins with some parallels and approximations between visual arts and history to understand the potential uses of historical materials in the artist’s projects. Then, we consider the debates about the experiences of the ‘death of photography’ and the ‘end of history’ amid pictorial or visual turns as a generation phenomenon, concluding with a historical interpretation of Rennó’s works.

Keywords (Source: Unesco Thesauro): Visual arts; photography; public history; document.



Em 2012, conheci pessoalmente Rosângela Rennó, em ocasião que a artista participava de uma mesa-redonda, no 21o Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, realizado no Rio de Janeiro, Brasil. A partir desse evento, mantive contato com a artista e, em 2015, tive a oportunidade de entrevistá-la em seu ateliê, no bairro carioca de Santa Teresa, como parte de um projeto de pesquisa com fontes de memória (orais e visuais).

Entretanto, antes mesmo do nosso primeiro encontro, as exposições de Rosângela Rennó já me provocavam com seus objetos obsoletos, imagens técnicas confrontadas em duplos de passados imaginados e sujeitos comuns, que emergem do passado para assumir o seu lugar na história. Uma mise en scène que me fazia pensar os laços comuns entre a história que ela propunha e a história que eu escrevia.

Os trabalhos da artista visual Rosângela Rennó possuem em comum o uso intensivo de materiais, como fotografia, objetos, álbuns, papéis etc. A artista promove, em suas obras, uma espécie de arqueologia do tempo comum, escavando, em arquivos, feiras de antiguidade, reservas de museus, jornais antigos, entre outros espaços, testemunhos de um tempo que já passou. Em suas obras, fomenta o exercício artístico de projetar no presente a tensão entre os tempos, em um trabalho que se aproxima muito à prática historiadora, a ponto de ser identificada como historiadora visual.

Em seu processo artístico, Rennó cria uma trama temporal complexa apoiada nas relações entre memória e imagem. A forma como a artista insere rastros e restos de experiência vivida por meio de objetos, documentos e fotografias em seu trabalho permite que se proponha uma reflexão sobre os domínios de uma história visual. Assim, o que passou como experiência emanada de vestígios dela mesma deixa de ser o passado cristalizado para se tornar um dos passados possíveis, considerando que a artista se utiliza do passado como matéria de imaginação.

Entre tantos caminhos que poderia ter tomado, aquela vivência, impregnada de vestígios, toma a vereda de matéria de arte. Além disso, o uso reiterado de fotografias como suporte ou mesmo restos dessa experiência qualifica o interesse da artista em entender o que está em jogo ao impregnar à imagem de humanidade e destinos que essa prática implica para a própria imagem: o álbum de família, o arquivo policial, o lixo do descarte. Que sociedade é essa que se deixa fotografar e guarda suas fotografias em álbuns e arquivos, mas que, ao mesmo tempo, descarta, desqualifica e desapropria a imagem de sua humanidade ao transformar todos em “fantasmas da gelatina” (para usar uma expressão da artista)?.

Na obra de Rennó, o exercício de referenciar o passado se faz por meio de uma prática artística que, ao mesmo tempo, nos aproxima e nos distancia da experiência comum e prosaica: os anônimos retornam sujeitos de uma história que cada um pode completar por meio de estratégias e recursos técnicos. Embora padronizados por uma prática institucionalizada, em sua obra, esses recursos são reorientados para um novo objetivo: construir uma narrativa sempre aberta e porosa que se completa pela afecção provocada em cada espectador.

Nesse sentido, a fotografia é, para a artista, o gesto de revelar um passado possível para cada sujeito descartado como imagem em um arquivo morto. Em certa medida, ecoa, nessa aproximação, as referências ao filósofo Giorgio Agamben (2007), segundo o qual: “a imagem fotográfica é sempre mais que uma imagem: é o lugar de um descarte, de um fragmento sublime entre o sensível e o inteligível, entre a cópia e a realidade, entre a lembrança e a esperança” (p. 29).

Paralelamente, observa-se, na arqueologia de Rennó, o florescimento de um pensamento plástico, engendrado pela forma como a fotografia ganha contornos narrativos em suas obras, compondo um exercício de história visual, sendo ela mesma uma historiadora visual. Nessa função, a artista trabalha a biografia das imagens, traçando suas diásporas e utilizando-se de sua atribuição de autora para promover a migração de métodos e estratégias de um campo para o outro. Práticas que tencionam os limites tênues entre o que referencia a verdade histórica e o que delimita a competência ficcional.

Com base em um recorrido sobre as diferentes obras em que a artista convoca o passado como matéria de imaginação, destaca-se, sobretudo, as estratégias utilizadas para trazer à tona passados possíveis que confrontem as narrativas celebrativas de passados consolidados.

Propõe-se, assim, inicialmente, uma reflexão sobre a relação entre prática artística e historiadora como meios para histórias públicas, adotando um percurso metodológico que se inicia com alguns paralelos e aproximações entre artes visuais e história a fim de compreender os possíveis usos do passado como matéria de conhecimento nos projetos da artista. Em seguida, associam-se os debates sobre as experiências da “morte da fotografia” e do “fim da história”, no bojo das viradas pictóricas ou visuais como fenômeno de geração; na conclusão, apresenta-se um exercício de interpretação histórica dos trabalhos de Rosângela Rennó em sintonia com as entrevistas de história oral realizadas com a artista.


Por uma história pública das imagens

O uso das imagens como forma de visualizar o passado não é novidade: basta lembrarmos das recomendações de Jonathas Serrano, professor de história do Colégio Pedro II, nas primeiras décadas do século 20, quando apontava filmes como importantes instrumentos didáticos, considerando-os materiais fundamentais do método indutivo em substituição ao método mnemônico. “Graças ao cinematógrafo, as insurreições históricas não são mais uma utopia”, escreveu Serrano, que acreditava também que os alunos poderiam aprender História “pelos olhos e não mais enfadonhamente só pelos ouvidos, em massudas, monótonas e indigestas prelações” (Serrano, 1912, citado por Nadai, 1993, p. 143). Ou ainda, se considerarmos a produção da Academia Imperial de Belas Artes, na segunda metade do século 19, voltada à produção de representações visuais sobre os marcos de fundação da nação brasileira. Os quadros de Victor Meirelles, Pedro Américo e Araújo eram exibidos em panoramas, no centro do Rio de Janeiro, exercendo fascínio na população, que tinha a oportunidade visualizar o passado nacional.

A pintura histórica, na percepção da historiadora Maraliz Christo (2009), apoiou-se em um programa de trabalho promovido por artistas intelectuais que assumiram para si a missão de representar o passado em imagens. A relação entre poder e representação visual do passado, na segunda metade do século 19, forjou uma grande narrativa para a nação brasileira que se completava com a produção intelectual do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sobretudo no que dizia respeito à configuração de um modelo de história didática em que o passado nacional, que pudesse ser ensinado, apresentava-se em produção literária de viés romântico e com política de consolidação das fronteiras nacionais.

Em seu estudo, Christo oferece um panorama da pintura histórica que acompanha a cronologia política do Brasil no século 19, de Colônia a Reino Unido e de Império à República. Observa, com atenção, que as formas de representação histórica inscritas nesse gênero de pintura apoiaram-se na atuação de artistas, dentre os quais Victor Meirelles e Pedro Américo, que muitas vezes impuseram visões próprias do passado, auspiciados pela distinção que a proximidade ao poder político lhes credenciava. Esse programa, apoiado na dialética da memória e do esquecimento, explica Christo, alimentou-se do temor que se reproduzisse no Brasil a fragmentação ocorrida no império espanhol com as independências latino-americanas, o que levou à elaboração de uma iconografia que valorizasse a continuidade entre passado e presente, e a unidade territorial em face do inimigo externo, omitindo temas como escravidão e revoltas internas (Christo, 2009, p. 1.154).

Apoiando-me nas considerações de Maraliz Christo, o que me interessa indagar diz respeito, justamente, à dimensão pública da experiência visual, que, ao colocar o expectador diante da representação do passado, lhe atribui uma consciência histórica. As dimensões das obras, o uso dos códigos realistas de representação, o ordenamento do espaço pictórico com a definição das hierarquias dos agentes históricos, entre outros aspectos que se poderiam explorar, oferecem condições ideais para que o passado seja recriado diante de seu público. A tópica da História Nacional ganha cores na pintura histórica que garante ao público aprender sobre o passado em lugares diversos da escola, mas que reforçam o aprendizado formal pela educação do olhar. Assim, a História como narrativa visual institucionalizada nos mundos das artes acadêmicas torna-se de domínio público.

Os investimentos para dar visibilidade ao passado por meio de imagens pictóricas ou técnicas fazem parte das práticas culturais de diferentes sociedades históricas ao longo do tempo, não sendo absolutamente uma prerrogativa do mundo contemporâneo. Entretanto, o seu reconhecimento como questão a ser colocada no campo dos estudos históricos é ainda tema em debate, pois, como aponta Knauss (2006), “a História como disciplina tem um encontro marcado com as fontes visuais” (p. 114).

Em dois trabalhos sobre o tema, Paulo Knauss (2006, 2008) oferece uma importante contribuição para a realização desse encontro. Vale ressaltar que suas reflexões caminham para tal encontro, juntamente com outro autor, Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses (2003), que defende a visualidade como plataforma de observação prioritária para lidar historicamente com as imagens.

Em Meneses (2003), o objetivo da história visual seria o de “deslocar o interesse de historiadores, das fontes visuais (iconografia e iconologia), para um tratamento mais abrangente da visualidade como uma dimensão importante da vida social e dos processos sociais” (p. 1). Sem pretender estabelecer um estatuto epistemológico independente para esse campo de estudos, o autor propõe que esse campo se volte para o estabelecimento de um conjunto de recursos metodológicos que substantive a prática historiadora num sentido amplo:

para que a História […] passe também a considerar a dimensão visual presente no todo social, seria a organização paulatina de um quadro de referenciais, informações, problemas e instrumentos conceituais e operacionais (inclusive para cruzamento de dados), relativos a três grandes feixes de questões: o visual, o visível e a visão. (Meneses, 2003, p. 2)

O domínio disciplinar das imagens se faz amplo e cada vez mais dinâmico, colocando dificuldades para o tratamento histórico do tema. Da tradicional história da arte, como história dos estilos, aos estudos visuais de caráter eminentemente interdisciplinar, o campo de debates se organiza em fóruns diferenciados. Os trabalhos de Knauss investem na sistematização de posições e no tratamento de questões fundamentais para que o encontro com as imagens se confirme na História. Um dos aspectos centrais de sua reflexão se relaciona à valorização da memória da disciplina histórica e ao reconhecimento, na própria tradição erudita, de elementos fundamentais de uma crítica não somente voltada ao tratamento do documento escrito, mas também dos registros visuais. Nesse sentido, Knauss (2008) propõe o fortalecimento dos elos entre a história da imagem e a história da arte para definir que o conceito de arte é histórico.

Observa-se, nessa proposição, a apresentação de um campo da operação histórica que toma a imagem como objeto, a princípio compartilhado com a história da arte, que, por sua vez, traz seu estatuto complexificado pelo autor. Essa problematização é feita ao se projetar a imagem no campo dos estudos visuais e da cultura visual, retirando da história da arte o monopólio sobre a imagem.

Em sintonia com o debate internacional, configurado a partir dos anos 1990, por um movimento denominado por Mitchell (2005) como “virada pictórica”, os estudos sobre as imagens técnicas e pictóricas realizados no âmbito da disciplina histórica, no Brasil, observam tanto a dimensão visual do social quanto os aspectos sociais do visual (Mitchell, 2005). Um movimento que considera a materialidade das imagens, colocando-as em contexto, tomando-as como parte da cultura material e agentes de relações sociais (Santiago Jr., 2019; Schiavinatto e Costa, 2016; Struken e Cartwigth, 2004).

Imagens-ato (Bredekamp, 2018) que atuam sobre o mundo e transitam nos tempos e por diferentes corpos. A experiência com imagens sustenta-se em sua natureza intermedial, ao considerar a tríade meio- corpo-imagem como o fundamento de uma antropologia da imagem (Belting, 2010). Nesses registros, as imagens são animadas pelo olhar do sujeito, ganham vida quando convocadas a atuar no mundo social.

As imagens aderem a suportes de diferentes tipos e tomam formas distintas, transitam dos arquivos para as exposições, assumem seu lugar social ao integrarem coleções em museus ou a fazerem parte das séries de estampas que as bibliotecas guardam. Ao longo da história humana, as imagens assumiram diferentes usos e funções, drenando muitas vezes seu valor de uso ao se tornarem objeto de desejo e fruição. A atitude de colocar imagens em contexto e indagar a situação em que se encontram e o sistema institucional a qual pertencem, permite, como nos ensina Edwards (2022), reconhecer a vida social da imagem como objeto da cultura.

Cabe, ainda, indagar como as culturas visuais e políticas se consolidam com base na relação que os públicos estabelecem com os passados possíveis que lhes são apresentados em diferentes espaços que possuem em comum, a dimensão pública. No Brasil, a noção de história pública ganhou contornos específicos nos últimos cinco anos. Para a minha reflexão, vale ressaltar que não se trata de um campo novo — mas, tal como a história visual, a história pública se tornou plataforma de observação das várias possibilidades de se elaborar representações históricas e pensar sobre suas condições de apropriação coletiva.

O historiador Ricardo Santhiago conjetura sobre a recente experiência de história pública no Brasil, em perspectiva com experiências internacionais, sobretudo, anglo-saxônicas, de trajetórias mais consolidadas, e propõe quatro dimensões de orientação pelas experiências de história pública: “história para o público, história com o público, história feita pelo público, história e público”. Segundo Santhiago (2016), cada uma dessas dimensões definiu diferentes formas de promover os usos públicos do passado de diversas coletividades das nacionais às comunidades de sentido.

A primeira dimensão, uma história voltada para o público, estaria volvida à difusão de conhecimento histórico dentro de uma lógica de ampliação de audiências, de ocupação de espaços para além da academia. O enfoque dessa perspectiva de história pública recai sobre a relação entre o conteúdo histórico e seu receptor. Ela visa tornar tal conteúdo acessível, difundindo-o por meio de uma miríade de canais: a literatura de ficção e não ficção, o jornalismo, a televisão, o cinema, o turismo histórico, os museus, os memoriais, a educação histórica, entre outros. A segunda dimensão envolveria o público como agente de sua própria história, superando a noção de difusão cultural, propondo uma história colaborativa. O público, em vez de consumir os resultados de um processo, tomaria parte nele, ativamente. Essa linha dialoga com outras tendências historiográficas nas quais o envolvimento com grupos e comunidades os converte de assunto da história em seus agentes e produtores. A terceira dimensão, identificada com as formas fragmentadas de narrar o passado vivido, estaria relacionada à tradição oral e às performances de memória de diferentes grupos sociais. Por fim, a quarta dimensão, caracterizada na dupla história e público, poderia ser pensada também pela chave da “cultura histórica” (Le Goff, 1985), em perspectiva democratizante, pois envolve experiências históricas que plasmam o passado em diferentes formas: dos monumentos e comemorações às invenções de tradições. Das práticas de reconhecimento dos passados plurais à percepção pública da história; das apropriações midiáticas aos mundos das artes (Santhiago, 2016).

Nesse sentido, a noção de história pública se estabelece como uma plataforma de observação de diversas atitudes historiadoras performadas por diferentes agentes históricos. Interessa, portanto, observar o papel desempenhado pelas artes visuais, que tomam o passado histórico como tema de trabalho. Isso porque se produz nos espaços expositivos — em que se incluem desde as exposições nacionais, internacionais, os salões de artes no século 19, mas também os museus nacionais de arte e de história e, mais recentemente, os centros culturais e sítios de memória — uma experiência coletiva de dar a ver e ver o passado em quadros que se expõem com base em um regime de historicidade (Hartog, 2013). Portanto, revela-se aí uma dimensão da história pública que me interessa interrogar.


A “morte da fotografia” e o “fim da história”

Para o desdobramento do meu argumento, gostaria de definir uma posição específica e um conceito-chave para lidar com a aproximação entre artes visuais e história: a posição de que toda a arte é histórica e, portanto, toda imagem possui uma historicidade fundamentada em uma prática cultural e social; sendo o conceito de cultura visual que viabiliza a centralidade da noção de visualidade como fenômeno social. A visualidade se fundamenta em imagens, é claro, mas também em um conjunto de textos não visuais que apoiam a criação de imagens por sujeitos históricos em um circuito social ampliado.

A posição defendida acima é a superação, no século 21, da chamada “revolução na consciência historiográfica”, que remonta aos anos 1960 (Le Goff, 1985), quando o ponto de partida das pesquisas históricas se desloca dos documentos para o problema, ao mesmo tempo que aponta à consolidação de um regime de historicidade no qual o presente, em que o problema é proposto, tem mais peso do que o passado, em que o documento havia sido produzido. O valor da questão a ser respondida pela pesquisa histórica estaria afiançado pelo modelo teórico no qual a proposta de estudo estivesse associada e ao projeto de sociedade a ela vinculado. Nessa perspectiva, o presente seria uma mera passagem de nível para o futuro.

Os anos 1980, marcados pela perda do telos que unia a história a uma única finalidade no futuro — sociedade sem classes/progresso global —, mergulharam na opacidade do passado. Como reflete o historiador francês François Hartog (2013), há que se superar esse estado de sublimação e trabalhar com a relação entre memória e história:

então veio um passado oculto, esquecido ou simplesmente falsificado (vinculado com o que acabei de dizer acerca do presente incômodo, que se tornou tão ansioso com a memória). Rememorar, não esquecer é apresentado como um dever pessoal dirigido a cada um de nós. Mas uma tal memória não é transmissão, mas reconstrução: história. (p. 36)

Os discursos sobre a morte da fotografia e o advento da tecnologia digital são quase contemporâneos aos do fim da história e tiveram o mesmo destino: de serem um fenômeno de geração. Combalida pela crise das utopias, a geração que, nos anos 1980, ingressa no espaço das sociabilidades públicas, por meio do acesso à universidade, ao consumo cultural mundializado e à praça pública dos movimentos sociais (no Brasil, notadamente, é a geração que participa do movimento pela redemocratização), vivencia a crise, buscando alternativas criativas aos discursos finalistas e fatalistas.

É dessa forma que estabeleço, ao menos, referindo-me ao Brasil, um paralelo entre a prática fotográfica, da qual o trabalho artístico de Rosângela Rennó é um dos expoentes, e a prática historiadora da qual boa parte da produção historiográfica, que se consolida nos programas de pós-graduação Brasil afora, é tributária. Em ambas as práticas — a artística e a historiadora —, um passado imprevisível significa muito mais, “novas questões a colocar ao passado e, se possível, novas respostas de sua parte, considerando- o um campo de potencialidades, de que algumas começaram a acontecer, foram interrompidas, ou evitadas, ou destruídas” (Hartog, 2013, p. 37).


A fotografia como gesto e o passado como matéria de imaginação

O exercício de interpretação histórica que proponho para a prática artística de Rennó vai tentar, primeiramente, caracterizar a fotografia como gesto para dar conta de como o anonimato se torna subjetividade por meio de seu trabalho; em seguida, identificar o papel que o passado ocupa na sua poética visual como matéria de imaginação.

Nas considerações que venho desenvolvendo acerca do engajamento como forma de autoria na prática fotográfica, defendo a fotografia como gesto em uma perspectiva que abraça as reflexões de Giorgio Agambem sobre a noção de autor. A situação de uma presença ausente redefine a concepção de autoria. O nome do autor não é simplesmente um nome próprio como outros, nem no plano da descrição nem naquele da designação; apoiado na noção de função-autor de Michel Foucault, afirma-se: “o autor não está morto, mas pôr-se como autor significa ocupar o lugar do morto. [...] E o que significa, para um indivíduo, ocupar o lugar do morto, deixar as próprias marcas em um lugar vazio?” (Agamben, 2007, p. 58). O sujeito/autor não é algo que possa ser alcançado diretamente de uma realidade substancial presente em algum lugar. Ele é resultante da experiência com os dispositivos (aqui no sentido de Foucault, ou seja, práticas e estratégias de sujeição) em que foi posto e se pôs em jogo.

A marca de presença do sujeito na imagem pelo gesto de captura que realiza o fotógrafo transforma qualquer experiência banal em um momento excepcional, em que, segundo Agamben, somos confrontados com o dia do juízo final. As explicações para todas as coisas foram potencializadas naquela marca de presença que se inscreve na superfície fotográfica como um devir. É a marca de da presença ausente; dela só existe a sombra da impregnação luminosa possibilitada pelo gesto do fotógrafo.

Essa natureza escatológica do gesto que o bom fotógrafo sabe colher, sem, porém, diminuir em nada a historicidade e singularidade do evento fotografado: “todas essas fotos contêm um inconfundível indício histórico, uma data inesquecível e, contudo, graças ao poder especial do gesto, tal indício remete agora a outro tempo, mais atual e mais urgente do que qualquer outro tempo cronológico” (Agamben, 2007, p. 28).

A situação fotografada implica a exigência do sujeito fotografado de não ser esquecido. Assim, essa exigência, que nada tem de factual, transforma-se em imperativo da defesa do sujeito histórico na representação:

Mesmo que a pessoa fotografada fosse hoje completamente esquecida, mesmo que seu nome fosse apagado para sempre da memória dos homens, mesmo assim, apesar disso – ou melhor, precisamente por isso – aquela pessoa, aquele rosto exigem o seu nome, exigem que não sejam esquecidos [...] as fotos são testemunhos de todos esses nomes perdidos, semelhantes ao livro da vida que o novo anjo apocalíptico – o anjo da fotografia – tem entre as mãos no final dos dias, ou seja, todos os dias. (Agamben, 2007, p. 30)

Na linha de Agamben, o autor é aquele cujo gesto de jogar com e nos dispositivos coloca em evidência a ausência de uma presença. Contraditoriamente, o sujeito que se apresenta em uma foto não está mais presente, foi jogado na foto e sua existência implica sua desaparição. O autor da foto, o fotógrafo, opera o dispositivo que captura a presença que definirá no futuro uma dupla ausência — do objeto fotografado e do próprio fotógrafo — que não existe mais a não ser fora de quadro, no fantasma de um alguém que some na espuma do tempo.

O gesto de jogar o sujeito na foto — de se jogar na imagem que expressa uma dada condição histórica — coloca o sujeito-fotógrafo em relação com os dispositivos da linguagem política. O jogo que se desenrola na arena política é apropriado pela expressão fotográfica, e o gesto do fotógrafo instaura uma presença ausente — os que lá estavam não mais estarão, mas permanecerão os seus rostos como identidade de sujeitos históricos, nas imagens que circularão e serão reproduzidas, apropriadas e analisadas no vir a ser da história.

As reflexões de Agamben ecoam nos trabalhos de Rennó. O Arquivo universal, projeto iniciado nos anos 1990, dá conta da prática historiadora da artista que tem como objetivo inventariar textos e notícias que se remetem à fotografia e à imagem fotográfica, farejando como o ogro da lenda e à maneira de Bloch (2001) a carne humana. Nesse processo de busca, tal como Foucault, no texto assinalado por Agamben, Rennó descobre a presença dos sujeitos como indivíduos vivos por meio do desvelamento dos processos objetivos de subjetivação, jogando com os dispositivos e mecanismos de poder, evidenciando sua farsa.

A presença do arquivo na arte contemporânea atua como sintoma da consciência histórica da contemporaneidade. A produção artística vem acompanhada de uma performance crítica em que se confundem propositadamente as formas de enunciação verbal e plástica, congregando o mundo das artes em uma espécie de “mania contemporânea pelos arquivos”. Essa expressão utilizada por Maria Angélica Melendi convoca a reflexão sobre a condição trágica da história, em que o passado é retirado da inércia dos arquivos em sua apropriação pela obra de Rosângela Rennó:

O ARQUIVO: os arquivos mantêm uma existência discreta. Por mais que os invoquemos, dia após dia, por mais que se publiquem livros e catálogos sobre eles, eles permanecem silenciosos, quase ocultos nas suas moradas sombrias. Até que, de repente, algo acontece. O que acontece é sempre uma catástrofe: natural — inundação, incêndio, soterramento — ou provocada — vandalismo, descuido, roubo. Paradoxalmente o acidente tira o arquivo de sua inércia. Se, quando íntegro, vivia uma vida precária, agora que foi atingido, renasce cheio de honra, como um mutilado de guerra que não oculta suas feridas nem disfarça suas cicatrizes. O arquivo vulnerado parece sempre estar mais vivo que o arquivo intocado — este é um arquivo improvável onde os rastros da memória perfilar-se-iam perfeitos e imóveis, cada qual no seu lugar, na calma vigilante dos cemitérios. A preocupação de Rosângela com o arquivo vem de longe. Talvez, possamos encontrar sua possível origem no Arquivo Universal, que Rennó seleciona e organiza desde 1992, constituído por textos de revistas e jornais que, segundo ela fala, narram histórias ordinárias sobre gente e fotografia. [...] Nos últimos anos, a artista envereda por trabalhos silenciosos, nos quais os arquivos são salvos por um gesto alternativo de reconhecimento ou de contra memória, que propõe novas ordens de associação afetiva, parcial e provisória. Neles os arquivos privados questionam os públicos, porque eles podem ser vistos como ordens perversas que procuram disturbar a ordem simbólica. O paradigma do artista como etnógrafo, que Hal Foster desenhara no final do século XX, pode se opor agora do artista como arquivista, aquele que opta pela construção de lugares de inscrição de memória. [...] Este artista, o artista arquivista, transformaria o não lugar do arquivo no não lugar da utopia. (Rennó, 2003, p. 15)

Agregaria às ponderações de Melendi, desenvolvidas no texto de abertura à entrevista da artista publicada em 2003 que, no trabalho de Rennó, a produção de um arquivo tem como objetivo duplicar a experiência histórica de sujeitos sem identificação específica e a interpolação de textos e fotografias que não possuem a mesma procedência, convidando o público a entrar no jogo da criação de múltiplos passados para aqueles anônimos que ganham vida na obra de arte. Na arte, inverte-se o jogo de reificação, fornecendo um passado possível ao sujeito da imagem. O depoimento de Rosângela Rennó esclarece, mas acima de tudo evidencia, o trabalho de historiadora visual e a criação de passados possíveis:

As fotos são testemunhos, provas, documentos que você guarda. Se eu pudesse arquivaria todos os retratos do mundo. [...] O Arquivo Universal é uma ironia em cima da ideia de colecionar infinitas fotografias que só se realizam através da leitura de textos sobre elas, que você não tem acesso à imagem propriamente dita. Você pode projetar a si próprio ou projetar sua foto, pelo fato de não poder conhecê-la. Assim, a foto transformada em palavras passa a integrar um arquivo que não acaba nunca, um arquivo que está sempre em transformação, que não tem tamanho definido, um arquivo virtual. […] Gosto dessa ideia de fazer o espectador entrar no jogo. […] Gosto da ideia de fazer você descobrir o indivíduo, se relacionar com ele ou recuperar através dele sua própria história pessoal. […] Gosto da ideia de fazer você entrar no jogo, você acha essa marca histórica, por exemplo, na foto dos presos. Mas minha estratégia é provocar uma espécie de apagamento do primeiro referencial para que essas imagens ganhem visibilidade, mas de uma nova forma, pois não faz sentido repetir o que está feito. Não faço sociologia ou antropologia. Mesmo que se considere um aspecto interdisciplinar na minha prática, a ponta do iceberg é de ordem estética. (Rennó, 2015, p.9)

Estratégias operadas pela artista colocam em realce o gesto fotográfico que existe no seu trabalho. Independentemente da própria fotografia, Rennó opera por meio da técnica da mise en abîme:

As obras de Rosângela Rennó, nas quais a artista refotografa velhas fotos e velhos negativos, podem ser consideradas ótimos exemplos de mise en abîme, tanto do ponto de vista mecânico quanto conceitual. Nascem da repetição mecânica de um gesto (o de tirar fotos) já executado; ao mesmo tempo, a imagem final remete conceitualmente ao original do qual ela foi tirada, sobrepõe-se a esta e a completa, tornando-a finalmente compreensível em todas as nuances. Como um conto fantástico de Borges, o espectador é colocado diante de duas imagens, mas vê somente uma. De fato, nesta extraordinária mise en abîme, a segunda imagem não é inferior a primeira nem em dimensões nem em importância: ao contrário, é uma reprodução tão fiel, que se sobrepõe perfeitamente ao original, eclipsando-o. (Visconti, 2003, p. 42)

Da mesma forma que na escrita da história, Rennó coloca a evidência em evidência, assim, busca atingir seu espectador para permitir um conhecimento só acessível por meio de sua prática artística. Em seu trabalho, a superação dos modos de ver o passado se processa pela sua inscrição na trama da consciência histórica do presente, na qual cada espectador ocupa o lugar central no destino das imagens. O futuro da tríade temporal é sempre uma possibilidade em aberto. Na verdade, como aponta Herkenhoff (1996), “a produção de Rennó tem marchado para constituir uma epistheme da fotografia” (p. 4).


Exercício de análise para concluir

Em 2005 e 2006, respectivamente, a Biblioteca Nacional e o Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro foram alvo de furtos em seus acervos fotográficos; as fotos recuperadas compõem duas obras publicadas em formato de livro da artista visual Rosângela Rennó. O primeiro, publicado em 2010, relaciona-se às peças furtadas na Biblioteca Nacional em 2005, ganhou o nome do número do processo criminal aberto sobre o caso 2005-510117385-5. Três anos depois, em 2013, a artista lançou o segundo livro que recebeu como denominação a notação de arquivo dos documentos roubados — A01 [COD. 19.1.1.43] — A27 [S|COD.23].

Para os lançamentos de 2010, no Paço Imperial, no Rio de Janeiro, e, de 2013, no auditório do próprio Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, foram organizadas mesas-redondas em que participaram os responsáveis pelos respectivos arquivos e a própria artista, no intuito não somente de apresentar ao público as obras, mas fundamentalmente engajar o público no debate sobre a preservação do patrimônio histórico e na necessidade de reiteração de que o furto não caísse no esquecimento e que se prevenissem futuros roubos. A publicação das obras e a mobilização do público se articulam a uma estratégia de comprometimento da artista e seus públicos em defesa da história.

A título de conclusão provisória, gostaria de refletir sobre a obra de Rosângela Rennó elaborada com base nos roubos dos acervos fotográficos do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, que sofreu a perda de inúmeras peças valiosas de seu acervo, dentre as quais 19 álbuns da coleção Pereira Passos, prefeito do Rio de Janeiro, então Capital Federal, e responsável por uma drástica reforma urbana que redesenhou o plano urbanístico da cidade. O processo de reforma da cidade foi acompanhado pelo então fotógrafo municipal, Augusto Malta, responsável por uma completa documentação fotográfica da transformação da cidade colonial em metrópole moderna.

Na apresentação da obra A01 [COD.19.1.1.43] — A27 [S|COD.23], cujo título alude à notação e à ordenação original dos álbuns, Rennó explica que os álbuns fotográficos dilacerados pela ação do roubo constituem a matéria central da obra. Ao folhear o livro da artista, somos jogados à cena do crime e presenciamos as cenas de vandalismo perpetradas pelos ladrões — capas de álbuns desprovidas de seu miolo, páginas arrancadas, fotografia incompletas, presilhas dos álbuns soltas; como restos de uma vida que não existe mais. O livro é uma potente denúncia sobre os abusos do mercado que transforma documentos históricos em fetiche de colecionadores, em que o valor agregado pela sedução da memória-mercadoria abre caminho para ações desse tipo. Além disso, é a confirmação, no trabalho de Rennó, da fotografia como gesto, que nessa obra garante vida às próprias imagens roubadas (Rennó, 2013).

Figura 1. Montagem com as páginas de A01 [COD.19.1.1.43] — A27 [s|COD.23]

No site da artista (Rennó, 2013), temos acesso à animação em que a obra se mostra ao observador. As páginas se sucedem em um movimento que pode ser repetido de acordo com a vontade de cada um. Entretanto, trata-se de um objeto, um livro, que, ao ser manuseado, remete o público à própria experiência de folhear um possível álbum arrasado pela experiência do roubo. Ao invés de drenar o valor de uso do objeto álbum, a artista recupera sua função original, denunciando a mercantilização do sistema de artes que nos remete a situações extremas de perda.

Observo que, no trabalho de Rosângela Rennó, revelam-se, em duplo movimento, as condições para o reconhecimento de uma consciência histórica contemporânea. O primeiro movimento caracteriza-se pelo ato artístico de uma história fotográfica — em que a experiência vivida no passado condensada em rastros, restos, indícios, registros etc. torna-se matéria de conhecimento histórico propriamente fotográfico: a fotografia não é só o meio, mas também a condição desse conhecimento. No segundo, evidencia-se a atribuição dos espaços expositivos e seus públicos como agentes de uma história pública. Nessa nova escrita visual da história, a mise en scène não segue os princípios do realismo, colocando o espectador diante da cena, como a pintura histórica do século 19 operava, mas promove a percepção do passado como intriga a se desvelar. O sujeito/espectador lança-se no jogo das diferenças e semelhanças proposto pelo sujeito/autor no exercício de engajar o público no reconhecimento de sua condição histórica. Sujeitos a serem esquecidos, como a fotografia pública de Rosângela Rennó, os “fantasmas da gelatina” retornam à sua condição humana.



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